quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A Bioética nos Cuidados Paliativos

Viviane Suelen Pinto Campos

INTRODUÇÃO

Devido às fragilidades da saúde individual adquiridas por diversos fatores, a Promoção da Saúde (PS) visa desenvolver programas que possam auxiliar o indivíduo e o coletivo no encontro de alternativas para a conquista de uma boa Qualidade de Vida (QV), mesmo que seja no fim da vida, como nos Cuidados Paliativos (CP).
Discutir este tema não é uma das preferências gerais. Para muitos profissionais descobrir que não existem recursos capazes de reverter o prognóstico de alguns pacientes, é mais que frustrante, é uma questão de desonra. Os poucos pesquisadores que investem nesta área, buscam mostrar que é possível algo além da QV e talvez isso possa ser chamado de Qualidade de Morte.
Os CP não devem ser vistos como falta de alternativa/tratamento, muito pelo contrário, a morte é inevitável para todos (ninguém vive eternamente), este tipo de cuidado não visa prolongar e nem reduzir a vida, o objetivo é proteger e dar atenção aos pacientes que não possuem tratamentos medicinais para cura e reversão do quadro de saúde.
A morte é algo natural, porém, aceitá-la e compreendê-la depende de vários fatores, tais como: meio social, cultura, crença religiosa, entre muitos outros.
Não paramos para pensar na morte, se muito, desejamos não sofrer no final da vida. Por isso, os CP visam amenizar as dores físicas e o sofrimento emocional do paciente e de seus familiares.


CUIDADOS NO FINAL DA VIDA

O termo paliativo deriva do latim “pallium”, que significa “manto”. Desta forma, a essência dos cuidados paliativos é aliviar os efeitos das doenças incuráveis, ou prover um manto para aquecer aqueles que passam frio, uma vez que não podem mais ser ajudados pela medicina curativa. Tradicionalmente, os cuidados paliativos eram vistos como sendo aplicáveis exclusivamente no momento em que a morte era irreversível. Hoje, são oferecidos no estágio inicial do curso de uma determinada doença progressiva, avançada e incurável. (PESSINI, 2005).
No contexto do cuidados no fim da vida, o conceito de “boa morte” tem sido utilizado no sentido de morte sem dor; respeitando os desejos do paciente, permanência em domicílio; ausência de conflitos; ambiente propício para uma boa relação entre o paciente, familiares e profissionais de saúde. (EMANUEL, 1998 apud FLORIANI, 2008).
A World Health Organization (WHO) em 2002 redefiniu o conceito de cuidados paliativos da seguinte forma: “É uma abordagem que aprimora a QV, dos pacientes e famílias que enfrentam problemas associados com doenças ameaçadoras de vida, através da prevenção e alívio do sofrimento, por meios de identificação precoce, avaliação correta e tratamento da dor e outros problemas de ordem física, psicossocial e espiritual”. (WHO, 2002).
Neste momento de atenção à saúde, a bioética deve estar presente em cada momento e principalmente em cada escolha. Para a Pessini (2005) a ética do cuidado enfatiza essencialmente a natureza vulnerável dos seres humanos e não diz somente respeito ao processo de decidir, mas também envolve a qualidade das relações. Os pacientes com doenças avançadas ou em estado terminal têm fundamentalmente os mesmos direitos que os outros. A recusa de tratamento deve ser mantida especialmente quando não existe reversão. Porém, esta recusa não deve influenciar na qualidade dos CP.
Segundo Siqueira (2007), deve-se comunicar a verdade a todos envolvidos, possibilitando a participação nas decisões, propiciando o início do processo de enlutamento, já que no caso do CP, a morte é iminente. Negar ao paciente e à família a sua condição de saúde é impedir que eles enfrentem seus medos.
Tratamentos considerados fúteis em doenças terminais acontecem com grande frequência, e a morte destes é muito comum em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI) quando já apresentam um prognóstico reservado durante considerável tempo prévio, em especial idosos frágeis e com alta dependência. (FLORIANI & SCHRAMM, 2008). Por intervenção de profissionais que não reconhecem a importância dos CP, pacientes são privados de ter uma “boa morte”.
O apoio multidisciplinar aos envolvidos nos CP é fundamental para uma aceitação do prognóstico. Para D’Assumpção (2007) “o homem nasce e morre sozinho, pois ninguém pode nascer ou morrer pelo outro.” Talvez esta questão fosse melhor compreendida e também aceita em outros momentos da vida, e não no final dela. Por isso, não é fácil aceitar a notícia de uma doença terminal.
A capacidade da equipe organizar continuadamente todas as ações e sempre estar atenta às necessidades do paciente - fundamentadas em suas preferências –, de seu cuidador e de sua família, são entendida nos CP como “proteção”. (Schuramm, 2001 apud Shuramm, 2007). Podemos dizer que esta capacidade é uma das mais importante para a conquista de uma boa morte.
Em suma, cada profissional deve compreender os limites dos tratamentos medicinais e dos riscos da iatrogenia, além disso, é preciso estar atento, para não privar o paciente e familiares da escolhas subjetivas.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao nascer temos a certeza de apenas uma coisa: “um dia iremos morrer”. O caminho a ser percorrido até o final da vida, sempre dependerá das escolhas individuais.
Todos temos o direito de viver com dignidade e de morrer com ela também. Infelizmente ainda vivemos uma medicina curativista e por isso, muitos lançam mão de alternativas que vão contra vários códigos de ética profissionais. Para Floriani & Schramm (2008) diante da necessidade moral de se organizar um modelo de assistência adequado aos pacientes com doenças avançadas e terminais, é necessário que a disciplina de CP faça parte obrigatoriamente da graduação para os profissionais de saúde, além de aumentar o incentivo de pesquisas nesta área.
Nenhum profissional é capaz de definir o dia e horário da morte de alguém, por isso, é preciso atenção e cautela no momento de comunicar um diagnóstico de terminalidade. Mas do que isso, precisamos ter ciência que um dia podemos estar do outro lado e receber este comunicado sobre um ente querido ou até mesmo, sobre a própria vida.

REFERÊNCIAS


DRANE, James. Cuidados no final de vida. Medicina Avançada: on line, 2003. Disponível em: . Acesso em 23 set. 2010.

D’ASSUPÇÃO, Evaldo A.. Os que partem, os que ficam - a morte não é problema para os que partem, e sim para os que ficam. Belo Horizonte: FUMARC, 2007.

FLORIANI, Ciro A. Cuidados paliativos no domicílio: desafios aos cuidados de crianças dependentes de tecnologia. J. Pediatr. (Rio J.) [online]. 2010, vol.86, n.1, pp. 15-19. ISSN 0021-7557.

FLORIANI, Ciro A..SCHRAMM, Fermin Roland. Cuidados paliativos: interfaces, conflitos e necessidades. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2008, vol.13, suppl.2, pp. 2123-2132. ISSN 1413-8123.

KIPPER, Délio José. A presença de cuidadores familiares nas instituições: questão de dignidade humana. Revista Bioética: 2007. Disponível em: . Acesso em 23 set. 2010.

PESSINI, Leo. Cuidados paliativos alguns aspectos conceituais, biográficos e éticos. 2005. Disponível em: . Acesso em 23 set. 2010.

SCHRAMM, Fermin Roland; FLORIANI, Ciro Augusto. Desafios morais e operacionais da inclusão dos cuidados paliativos na rede de atenção básica. Cad. Saúde Pública [online]. 2007, vol.23, n.9, pp. 2072-2080. ISSN 0102-311X.

SIQUEIRA, Karyn Albrecht; MASSAROLI, Aline; LICHESKI, Ana Paula; GIORGI Maria Denise Mesadri, Bioética e cuidados paliativos: um desafio para enfermagem. 2007. Disponível em: . Acesso em 22 set. 2010.

WORLD HEALTH ORGANIZATION. National cancer control programmes: policies and managerial guidelines. 2nd Ed. Geneva: World Health Organization, 2002.

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